Dezembro na área, o Natal mordendo-me o tornozelo, o Ano Novo afiando as unhas, tenho pouco tempo para prestar contas. Difícil começar, a garganta arranha, a voz engrola, a frase não embala, efeitos de um espirito temeroso em expor seu avesso ao sol, iluminar a coisa escura em praça pública. Processo nada instagramável, a propósito.…
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Pré-crônica
De um tempo pra cá, expressões do tipo pré-treino, pré-aula, pré-xampu, pré-venda, pré-evento, pré-reserva pegaram que nem resfriado. Daqui pra frente (ou pra trás?) nada do que fizermos será realizado de pronto. Sempre haverá um esquenta. Fenômeno assustador, basta pensar em formas como pré-dormir, pré-acordar, pré-andar, pré-sorrir, pré-viver. Isso nos deixará em um estado de…
Lições de casa
O sabiá mirava o horizonte, apoiado no galho de uma Bracatinga. Calibrava as asas, interrogava o ar, ponderava qual melhor hora de voar dali onde há pouco sua vida quase expirara. Primeiro bateu na vidraça da janela a seis metros de altura, depois, no chão, ficou imóvel, contando com a sorte, que o atendeu, resgatado…
Cinco formas de ir pro beleléu
A primeira é tropeçar em um gato. Bem provável quando se convive com três. Há vídeos no Tik Tok que mostram os vários gêneros dessa forma de evadir-se do convívio humano. À noite, a visão ruim, a luz apagada, o estado entre a vigília e o sono favorecem o encontro com o fim, ou, antes,…
Cuidado com a crônica
Um retângulo de papelão escrito Fome. Nem seis graus Celsius, quem abre a janela do carro à noite, no cruzamento da Cândido de Abreu com a Barão de Antonina, prum sujeito sem carnes, pardo, segurando uma placa chinfrim destas? Nem a pau, num frio do djanho desses, Vai trabalhar! Eu não trabalho!, grasna o Pelicano…
Da missa, a metade
O padre octogenário lê o Evangelho de João feito uma criança de nove anos. A catedral de Curitiba parece um salão de baile da terceira idade. A missa do meio-dia avança embrulhada numa quarta-feira gelada. Dois idosos surgem entre os bancos da assistência cada um empunhando uma salva, algo entre um enorme coador de café…
Aos pedaços
ao neoliberalismo, que nos mói sem trégua Do Pilarzinho até o Aeroporto em São José dos Pinhais, Claudinei narrou-me seu amor (seletivo) ao cinema. Só gosta de filmes históricos ou de vampiro. Se superproduzidos, melhor. À medida que a conversa se desenrolava, notava que estava diante de um amador profissional. Amador, porque nos dias de…
Altas gentilezas
Há uma turma da pesada querendo finalizar o planeta. Fazem isso sem sujar o terno. O ringue são as redes sociais, onde jabeiam com posts, memes, fake news e o diabo digital a quatro. Leva o cinturão quem mente mais. Claro que muita maldade más grande se hace nos bastidores, realíssima. Mas não vim aqui…
Arte da fuga
Quanto tempo você fica sem espiar o celular? Não valem as horas de sono, nem as de banho. As de sexo e dirigindo contam, pois há quem monetize fornicando ou no volante. Largar esse osso digital não é fácil. É uma sofrência. Têm alguns sortudos que desconectam-se algumas horas por dia -- ou porque trabalham…
Pede água
para Aurora Tudo começou com minha filha, há uns seis, sete anos, não sei bem. -- Pai, você tem que tomar água. A alimentação pra ela navega em outro registro, água é mineral, carne é proteína, batata é carboidrato. -- Pai, você tem que tomar água, tantos litros por dia! Arrogante e conservador, ignorei esse…









