Tudo agora notifica. Whatsapp, Teams, Instragram, Facebook, Google, Youtube, mais as redes que graças ao bom deus analógico desconheço. Abertos celular ou computador, lá estão elas, na forma de algarismos, num fundo vermelho ou noutra cor berrante, pulsando pra clicarmos ali e nos afundarmos no looping digital do qual só sairemos depois de quinze, vinte minutos, com muita sorte. O antídoto é bloquear as notificações nas configurações.
Ufa!
Mas o veneno está inoculado. O ícone do app ali, imóvel, inocente, como se nada houvesse no metaverso, nada acontecesse no mundo digital. A quietude começa a incomodar. A gente se coça. DIgita uma coisa aqui, outra ali, lemos um texto acolá, assistimos a um vídeo alhures, pagamos umas contas, copiamos uma receita, nos coçamos de novo, nos segurando para não clicar em ícone nenhum. É questão de tempo. Um clique desgarra-se e afunda o cursor no ícone numinoso e somos tragados pelos gatinhos do Instagram, pelas plubis de investimentos, por coachs e médicos sorridentes, todos apontando para uma Nárnia onde o dinheiro cai dos galhos, a felicidade brota do chão, os gatinhos vivem em um looping de cena fofas e o envelhecimento é coisa do passado. E só saímos desse transe por uma notificação forte da nossa plataforma colaborativa, a do nosso chefe digital. Sem querer querendo, as reativamos, elas voltam.
Bons tempos em que a notificação vinha em papel. A nota só nos alcançava fisicamente. Tá certo que ser notificado não significava coisa boa. Ou era o patrão, juiz ou órgão do Estado qualquer que nos informava que deveríamos comparecer a algum lugar ou tomar ciência de algo que muito provavelmente não nos beneficiaria em nada. Uma vantagem é que não vinham aos cântaros, só eventualmente, e alguns só vinham caso provocássemos. Hoje, digital, vêm de todos os lados, ainda que algumas provocadas também. Quer dizer, impulsionadas por nós mesmos, ainda que boa parte das vezes involuntariamente. Primeiro vem a notificaçao digital, depois descobrimos como desativá-la. Meio como aqueles pop-ups que expõem um ACEITO destacado, em par com um não aceito desenxabido, quase envergonhado de ser clicado. Sem mais nem menos, aceitamos. E tome notificação, newsletters e afins.
Há também as luzinhas verdes acesas que denunciam nossa presença on-line. Na empresa, é a chama da submissão; ai de nós, se esquecermos de deixá-la viva enquanto trabalhamos. Na ansiedade de mostrar-se presente virtualmente, acendemos as lampadinhas caguetas de todas as redes sociais e já não sabemos bem o que o RH achará disso. Rh, não, sorry, Departamento de Gestão de Pessoas. Nome bom, sem eufemismos, o negócio é dirigir as pessoas, gerenciá-las mesmo, nada humano, como nos queria engambelar o falecido nome. E tem as cobranças por que não me respondeu se estava on-line? Eu, não! Quem tava era o computador ou celular; eu tava é cochilando. Ou no banheiro ou assistindo a um vídeo no Youtube ou rolando o feed como um hamster numa gaiola, poderíamos responder também.
De notificação em notificação vamos sendo engolidos pelas telas dos dispositivos eletrônicos. A notificação que nos afaga é a mesma que nos apedreja. Há três agora na minha barra de ferramentas aguardando serem clicadas. Mas domingo, não. Sou resistência. Mas é melhor não cutucar a notificação com cursor curto e encerrar esta crônica, desligar o computador, baixar a tampa do notebook e navegar o máximo que puder pelo mundo presencial até segunda-feira.
