Parafusaram uma imensa roda gigante no calçadão da XV. Espremida entre os prédios vizinhos à Praça Osório, ela ocupa quase toda largura da rua. Os pedestres vão e vem pelas laterais no apertado espaço que sobrou para circularem. A roda alcança vinte metros, mais ou menos a altura de sete andares dos edifícios próximos. Tem um círculo luminoso azul no centro, como o olho de um ciclope, do qual partem raios fosforescentes onde se penduram as grandes cabines em que levitam os passageiros. Uma fila imensa à noite comprova a adesão dos moradores a essa ideia imodesta. Uma empresa local a patrocina dando a entender que os cidadãos não pagam essa aventura ingente, embora faça parte do Natal de Curitiba – Luz dos Pinhais organizado pela prefeitura de Curitiba.
Esse pratão luminoso não parece o brinquedo singelo que girava no parquinho à margem do córrego da Água Espraiada, na avenida Santo Amaro, na década de 1970. Se alcançava uns dez metros era muito, tinha cadeiras (não cabines como esse titã da rua XV), rangia bastante e parava muito. Disputava nossas preferências com o trem-fantasma e o carrinho de batida. Nada delicados, funcionavam com muito solavanco, base de nossos sustos e alegrias. A roda gigante dava um pequeno tranco quando parava, chacoalhando as cadeiras no ar; o trem fantasma, que parecia muito rápido naquela década do século passado, realizava materialmente a quadratura do círculo — o vagonete fazia curvas retilíneas, dava um soco em cada uma delas, estalava tudo, antes da aparição de um esqueleto que pulava como um boneco de mola no fim do túnel. E o carrinho de batida era só tranco. Um mundo de alavancas, engrenagens. graxa, polias e trilha sonora metálica.
Não subi nesta roda dos anos 2023. De longe parece flutuar, as luzes lhe dão um ar imaterial, como se estivesse em uma tela de cinema colossal. É luz pra tudo quanto é lado, nas grades de proteção, no pórtico de entrada, nos desenhos natalinos, dando um ar fantasmagórico ao conjunto. A sensação em terra firme é que tudo ali move-se como nuvens, é girar pra crer.
Seja como for, a imensa roda cravejada de led atraiu para o centro de Curitiba uma pequena multidão. Falta de diversão? Diversão boa? Ingressos grátis ajudam? O leitor e a leitora decidam.
Ao redor do brinquedão, as lojas do centro mantêm as portas abertas esticando o horário de vendas do Natal. Atrás, corre a feira da praça Osório, pilhada também pelas luzes e a ansiedade de fim do ano. Para o bem e para o mal, o calçadão está repleto de gente à noite, algo raro por aqui. Talvez não seja pelos melhores motivos, mas o Centro está girando num outro grau, aonde isso vai parar, não sabemos, mas quando, sim, sabemos, no fim do Natal.
* Roda-gigante no calçadão da XV, Curitiba (foto minha)
